sábado, 30 de agosto de 2008

Failure is cool


Eu espiava pela janela enquanto fazia dever de casa e via a cachorra dormindo ao sol no quintal. E tantas vezes eu desejei ser como ela e não ter que me preocupar com a aula ou a prova do dia seguinte. Às vezes eu também desejava ser como a minha avó, que, depois de cozinhar o almoço, tinha tempo livre o suficiente para assistir a todas as novelas da tarde. Essas são as lembrança mais antigas que eu tenho das minhas manifestações hedonistas. Reprimidas já naquele tempo pelas terríveis ameaças de fracasso escolar. Demorei muito para colocar em questão essa noção de fracasso. Demorei para me dar conta de quanto tempo eu perdi me esforçando para alcançar metas inúteis - tirar nota boa na prova, fechar no 3o semestre, ser a primeira aluna do colégio, ter o papel principal na peça de encerramento do ano, me formar na faculdade sem pegar depê, falar algo inteligente nos grupos de discussão, conseguir um emprego, obter um elogio do chefe etc... That's not cool. E em um certo momento isso sim me pareceu fracasso, ao contrário do que me diziam as notas do meu histórico escolar, os meus títulos acadêmicos e a minha conta no banco. Não sei por que pressupus por tanto tempo que haveria alguma lógica em tudo isso ou uma tendência que me levaria a algum lugar que supostamente seria melhor que o lugar onde estou hoje. Acho que chamam isso de ambição. Talvez a única forma de dar sentido às tantas coisas idiotas que nos vemos obrigados a fazer é mesmo traçar uma linha imaginária entre todas elas, transmitindo a sensação de continuidade e progresso pessoal. Acreditar nisso talvez seja a única forma de aceitar o peso da irracionalidade da decisão de postergar o prazer indefinidamente. Ah, sim: podemos considerar que os religiosos - que eu costumo tanto desprezar - fazem a mesma coisa. A única diferença é que eles assumem de cara a inexplicabilidade dos mandamentos que os levam a postergar o prazer para depois da vida, ou seja, a renunciar definitivamente a ele. Talvez sejam mais honestos... Por que, afinal, é tão difícil simplesmente desfrutar a existência? Acho que é porque temos medo da morte. Simplesmente não aguentamos lidar com a contingência e a transitoriedade de nós mesmos. Não aguentamos pensar que esse momento futuro pode não existir. E vivemos sob o cinismo ou a inocência (dependendo do caso) de que ele sempre virá e de que estaremos vivos para desfrutá-lo. What the hell are we doing to our lives?

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Talvez o hedonismo venha de uma carência ancestral. Tão ancestral como pode ter sido o seu momento anterior a esse instante. Ser ancestral não diz respeito ao tempo passado. Ser ancestral é encontrar o passado no presente e, por ser assim, ser eterno. Intrínseco. Forever. Talvez o hedonismo seja uma carência ancestral. Por isso constante.

 Por mais hedonistas que possamos ser, ou vir a, sempre carregaremos essa carência ancestral. Esse faltar algo que nunca se sabe o que é.

Nem por isso pode se dizer que o hedonismo esteja fadado ao fracasso. O hedonismo, uma batalha constante, um confronto eterno com a ancestralidade,  é como uma planta que precisa ser regada todo o dia. Um tratamento sem fim. O excesso de zelo porém, pode levar os seus galhos a um crescimento desordenado.