terça-feira, 30 de março de 2010

terça-feira em são paulo:

suddenly your loneliness makes sense among others' and some life, yet unspent, might explode.

domingo, 28 de março de 2010

around?

às vezes eu mexo em caixas que é como se estivessem fechadas para sempre. porque temos muitos jeitos de dizer nunca. guardo coisas que eu não tive coragem de destruir, o que as condenou a uma sobrevivência medíocre. não é sempre que eu as olho, pois é impossível viver o presente com tanto passado. só se faz isso em dia de mudança ou de estante nova. nos demais,´è preciso deixar o esquecimento exalar seu perfume antisséptico. eu abro uma caixa e olho para coisas que eu nao sinto falta. do you miss me like you said you do? essa música se chama miss misery e é da trilha de um dos meus filmes preferidos. toca no final, quando ele resolve pegar o carro e ir para a califórnia encontrar ela. eu acho que hoje eu estou muito mais perto de lá. ainda que o perto demore um pouco, isso já é alguma coisa. pelo menos eu já posso fazer planos e preparar a playlist que vai tocar na viagem entre los angeles e são francisco.

ontem foi casamento de uma amiga da faculdade e eu não fui. casamentos são estranhos e a música que toca é sempre ruim. mas as pessoas dançam ou porque são falsas demais ou inocentes demais. eu já fui as duas coisas e não quero mais. elliot smith continua tocando e ele sempre diz algo certeiro para mim. é ele que descreve como eu me sinto uma bosta na manhã seguinte. na manhã seguinte, eu sou mais elliot smith do que bukowski. provavelmente porque na noite anterior também tenha sido assim. mas sei que eu posso ser o outro, se eu quiser. sei onde está a saída e como chegar lá e isso basta, ainda que eu decida ficar. não é por acaso que agora está tocando between the bars.

searching west and east and all points in-between, underneath the lines of thought: you're there and then you're not

sábado, 27 de março de 2010

insolação.

- Eu estou esperando alguém.

- Essa é uma frase muito bonita.

- Voce quer tomar um café?

Assim termina o filme. Vc viu o filme antes de termos nós mesmos pronunciado essas frases na semana passada. E pode ser que só esse fato já faça diferença na opinião que temos sobre o final do filme. Com tantas coisas inexplicadas, e que por isso parecem tão reais. São a mesmas frases, só que em ordem diferente. Faz toda a diferença não acabar na frase do café. É, a da espera é uma frase bonita mesmo. A espera é bonita não tanto porque as possibilidades de quem espera sejam infinitas, mas porque achamos que são. E alguém fala uma frase parecida com essa logo no começo do filme, mas sobre a juventude. Que não deixa de ser um tipo de espera também. Eu diria que é um tipo de beleza em abstrato. Porque quase sempre o que é bonito de contar é ruim de viver. Eu queria que a espera fosse mais curta do que o tempo que eu levo para pronunciar por inteiro a frase: - Eu te espero. Assim, quando eu terminasse de falar o o, a frase já seria obsoleta. Mas ainda seria bonita.

- Logo. [Você me diz.]

- Quão logo é logo? [ Eu pergunto e penso que essa frase parece de uma música do Belle & Sebastian.]

- A sua testa está quente. Parece que você pegou uma insolação. [Essa frase também veio do filme. E o calor é o que estou sentindo agora.]

quinta-feira, 25 de março de 2010

the horses are here

eu vinha andando rápido pelo lado direito, desviando em zigue-zague das pessoas que caminhavam na direção oposta, quando soou o aviso seco e as portas se fecharam. o trem que me levaria a baden-baden começou a se movimentar e eu perdi a conexão. esse é o momento em que vc se sente como se estivesse de pé no centro da quadra do jogo de vôlei do colégio vendo a bola passar bem acima da sua cabeça. não há o que fazer. ela não esta mais ao seu alcance, mas isso nem é ruim. vc só tem que se posicionar novamente e esperar pelo próximo saque. eu acompanhei tudo só com o movimento do pescoco e qdo minha cabeça terminou de fazer o arco e voltou a estar no mesmo eixo que a coluna, eu pensei numa coisa que eu havia lido em algum lugar e até hj não me lembro onde. algo que dizia sobre a transformação do tempo que acontece nesse exato minuto em que a porta do vagão se fecha e o trem começa a andar te deixando do lado de fora. de repente o tempo, que era escasso, fica abundante. vc tem tempo de sobra prá matar até que o proximo trem passe. aquilo que era só pressa e ânsia vira uma espécie de espera calma e entediante. sentada no banco da estação, vc já nem olha mais o relógio e só precisa pensar em fazer algo para se entreter. mirar o olhar longe até os seus olhos alcançarem o horizonte lá no fundo, depois das árvores, e procurar um pensamento agradável para seguir. o próximo trem chegará na plataforma 6 às 17:37 e se vc vai ou não conseguir pegá-lo não está mais em questão. é um sentimento meio contraditório, porque no instante em que o tempo em vez de fugir resolve ficar, vc imediatamente se sente de mãos vazias. vc olha pros lados e nem sabe direito o que fazer com elas. aquilo q vc tentava esmagar com a força dos dedos desaparece rápido. vc já não precisa ficar oscilando ofegantemente entre o pessimismo incrédulo e o otimismo místico. tudo isso acaba de escorrer pelos vãos dos seus dedos e cair no chão sujo da estação. eu deixei cair a última mordida do sanduiche que estava comendo. aquele pedaço de pão já estava quase apodrecendo, mas eu queria continuar não sei bem porquê. eu me sinto aliviada, mas ao mesmo tempo um pouco perdida. olho de um jeito meio nostálgico para aquilo que já estava me dando náuseas, mas por alguma razão queria continuar mastigando. eu sei que não posso pegar de volta do chão. eu nem quero, mas penso nessa possibilidade. no final das contas, sinto uma espécie de resignaçao boa. devagar eu me sento no banco da estação e é como se ao mesmo tempo nada estivesse faltando e tudo estivesse faltando. é uma espécie de vazio satisfeito. sinto que o banco é confortável, mas sei que em algum momento ele vai começar a me incomodar. por enquanto isso não me preocupa. eu deixo a mochila do meu lado direito e vou girando o botão redondo do ipod para baixo até parar em uma das minhas musicas preferidas. escolho um canto bonito do céu para estar olhando bem no momento em que ela começar a tocar. eu sei que em breve estarei atravessando o país em direção ao sul, onde a primavera já chegou. mas por enquanto estou sentindo o chão frio e firme bem embaixo dos meus pés. não há angustia. está tudo certo, mas esperar por vc é como estar sentada no banco da plataforma 6.

segunda-feira, 22 de março de 2010

meditação

Eu estava descendo a Pamplona e do lado direito vi um restaurante com uma faixa branca cheia de informações sobre menus promocionais e no final um aviso de que eles tambem têm sistema buffet. O cartaz dizia: "coma à vontatade". Isso mesmo, com dois tas. Eu fiquei pensando no cara que errou. Deve ter ficado puto, porque errou bem no final. Deve ter ligado pro cliente, contado a real e oferecido a placa errada sem cobrar nada. Pelo menos ele não gastaria mais material, nem trabalho. O dono do restaurante, por sua vez, conseguiu uma placa de graça. Tem um erro no final, mas nao importa porque todo mundo entendeu o recado. Eu fiquei pensando sobre isso uns quarto quarteirões pra baixo e de repente me surpreendi com o tamanho do pensamento que eu fui capaz de engrenar, sem perceber, sobre uma sílaba a mais na placa de um restaurante que tem sistema a kilo ou buffet. Desde que eu comecei a tentar meditar eu percebo que nao tenho nenhum controle sobre os pensamentos que aparecem ou somem da minha cabeça. O segredo da meditação é nao se prender a nenhum deles. Deixar eles irem embora, de modo tão inesperado e silencioso quanto chegaram. Eu só não posso me assustar com a minha capacidade imensa de pensar em coisas inúteis. É impossível evitar. Que nem quando eu começo a pensar em vc durante o dia. É quase tão inútil quanto pensar na placa. Vc é só um pensamento que aparece de vez em quando e eu tenho que deixar ir embora. Por mais que isso pareça estranho, certas coisas se resolvem durante o silêncio:

domingo, 21 de março de 2010

rubber soul



eu olho para o porta-retrato que fica na estante em cima do som e vejo a foto antiga da minha mãe. eu gosto dessa foto. não só porque é a foto da minha mãe, mas porque ela tem uma composição que faz muito sentido prá mim esteticamente. ou porque eu devo ter achado legal ver as duas coisas juntas. por isso resgatei ela do meio da bagunça da mudança e a botei no porta-retrato vazio. eu acho que a garota da foto já era minha mãe e isso quer dizer que essa foto já é bem antiga. as cores têm uma harmonia lavada. o verde envelhecido da grama combina com o maiô vinho-quase-marrom que ela está usando. ela está sentada na grama e tem uma árvore cortada atrás dela. o toco da árvore em tese não combinaria com a felicidade dela. nem com o sorriso doce, nem com o boné branco que ela está usando, que dá um tom meio inocente para a cena. acho que hoje em dia ninguém ia querer tirar uma foto ao lado de uma árvore cortada. mas eles viram a beleza desse objeto quase morto. ou nem se preocuparam com a paisagem atrás. é bem possível que quem tenha tirado a foto - talvez meu pai, talvez meu tio - estivesse tão consumido pela beleza da garota, que não prestou mais atenção em nada. eles provavelmente estão no que meus pais chamam de "o clube fiscal". eu não me lembro de ter estado, mas eles dizem que a gente sempre passava os fins de semana lá com os meus tios quando eu era criança. e que minha tia cozinhava empanadas para levar. eu sempre achei o nome desse clube meio estranho, mas depois de grande eu me liguei que "o clube fiscal" devia ser o jeito abreviado de dizer que o clube era de alguma associação de fiscais. tipo fiscais do imposto de renda. meus pais não são fiscais. qualquer dia vou perguntar a eles porque conseguiam frequentar o clube. é provável que eles tivessem algum amigo fiscal. se eu me lembrasse, eu teria nostalgia desse tempo em que passávamos os domingos fazendo pic-nic no clube fiscal. um grupo de amigos saindo de são paulo em caravana, levando comida caseira e filhos para passar um dia no sol. era o tempo dos corcéis. eu sei que meu pai teve um corcel I vermelho e depois um corcel II verde claro. eu só me lembro do segundo e na minha cabeça ele tinha umas marcas de ferrugem perto do porta-malas, o que quer dizer que minha memória só chega a alcançar o tempo em que o carro já estava velho. a ford produziu corcéis no brasil entre 68 e 86. eu nasci numa época em que ainda se produziam corcéis no brasil e isso já é o suficiente para definir uma geração. quando eu olho bem para o rosto da minha mãe nessa foto, eu sempre acho ela meio parecida com o john lennon na capa do rubber soul. a diferença é que ela está sorrindo e ele não. a árvore atrás dele tem galhos e folhas e a que está atrás dela não. ela está sozinha no meio da foto e ele também.

sábado, 13 de março de 2010

Ce matin là

o dia amanheceu e a luz entrando no quarto pelos furos da persiana fez com que notássemos que aquela era a primeira da manhã. naquele amanhecer, o dia era a promessa de algo que em breve se desfez. quando vc foi embora, eu não tive sono. eu botei uma música calma e parei na varanda para sentir sentimentos tautológicos me atravessando. aqueles que chegam no limite da linguagem, porque são inabarcáveis. "estou fascinada" é uma frase que não pode receber qualquer complemento. por isso, eu vou ficar esperando pela segunda da manhã. ainda que não seja manhã. e ainda que percamos a conta.