sexta-feira, 17 de setembro de 2010

prisons. or: no bridge over trouble water





- vc é americana?
-não, sou de san francisco.
- ah, ok.
- eu prefiro deixar claro que não sou um deles.
[o dilema do forasteiro, pensei]
- san francisco is a nice city . eu não conheço, mas sei. quero ir para a Califórnia e viajar de carro.

eu não me lembro como a conversa saiu disso e percorreu tão rápido camadas geológicas de profundidade, mas de repente eu olho para lisa e ela tem lágrimas nos olhos. ela passa as mãos pelos braços e diz que está arrepiada. agora já não me lembro mais da palavra em inglês, era uma palavra que eu não conhecia. e nem precisava, pois o gesto é universal.
ela estava falando sobre o documentário que ganhou sundance, trouble the waters, sobre New Orleans. o diretor deu uma câmera para uma mulher que filmou a água entrando em sua casa, invadindo o batente da porta e se apossando violentamente de todos os espaços. a água ia subindo e em pouco tempo ela já cobria seu pé. aos poucos, o fetiche da auto-destruição - a fronteira móvel entre vítima e mártir. mas o pior, says lisa, nem é isso. essas pessoas viveram uma catástrofe, perderam suas casas, perderam tudo, mas a maioria conseguiu se salvar. o que fez lisa chorar foi ter se lembrado de que no meio de toda a enchente, do desespero ao som do vento, esqueceram-se dos presídios. ninguém pensou nas pessoas que estavam ali dentro. ninguém lhes abriu a porta para que pudessem se salvar. afinal, quem acha que presos têm direito a não se afogar na enchente?
e esse parece ser um consenso em qualquer parte do mundo.

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

THERE ARE NO COINCIDENCES IN THE HOT SUN OF A CHRISTMAS DAY



Or, in other words:








essas fotos parecem velhas. a pré-história do que somos hoje. mas kinks e sunny afternoons teremos para sempre.

[one out of the series: processing your past, it's healthy, namaste.]

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

às vezes é você e você
às vezes é você e ele/ela
mas são sempre dois no ringue (quase sempre)
gil, caetano. quase gal.
seu irmão é o seu amor
por causa da mulher.




domingo, 20 de junho de 2010


- why don't you get lost?
- because i am already

enquanto isso eu lia na parede daquela escola uma frase da rosa luxemburgo que dizia: não estamos perdidos. pelo contrário, venceremos se não tivermos desaprendido a aprender.
vencer já não significa a mesma coisa hoje, mas talvez aprender sim. talvez aprender seja sempre a única coisa que resta.
quando chega o fim da semana, tudo o que eu tenho é não estar vencida e meu sangue latino. isso já é suficiente para não me incomodar com estar perdida. se vc tem pelo menos duas certezas, já não está tecnicamente perdida. não importa se a sua dor de estômago vem dos agrotóxicos que vc ingere ou é só angústia somatizada. esse é o tipo de coisa que não faz diferença. o que estão fazendo hoje os dominicanos filhos-da-puta que entregaram marighela também não. eles já estão todos tecnicamente mortos.
rosa luxemburgo virou o nome de uma das praças mais frias de se atravessar no inverno de berlim por causa da confluência de ventos. é também o lugar de onde vimos, mais de uma vez, a revoada de pássaros noturnos fazendo bagunça no céu. eles não eram sincronizados e os barulhos q faziam eram esquisitos, eram cantos desarmoniosos.
a lua quieta acima deles. as ruas quietas e vazias abaixo deles. e nós lá, parados, olhando para cima e deixando que a nossa última reserva de calor fosse finalmente roubada.
não, não desaprendemos a aprender.

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Les parapluies de Cherbourg (ou, em português, os guarda-chuvas do amor) [für v.]





"Les hommes ne cessent pas de fabriquer une ombrelle qui les abrite, sur le dessous de laquelle ils tracent un firmament et écrivent leur conventions, leurs opinions ; mais le poète, l'artiste pratique une fente dans l'ombrelle, il déchire même le firmament, pour faire passer un peu du chaos libre et venteux et cadrer dans une brusque lumière une vision qui apparaît à travers la fente."

Gilles Deleuze § Felix Guattari, Qu'est-ce que la philosophie ?


era uma prova à nossa sincronicidade e eu corri o risco. porque um dos meus lugares preferidos de berlim é de uma beleza bem estranha. ou de uma feiura tamanha, que já virou beleza. a ponte sobre os trilhos de trem enferrujados, de onde se vêem prédios industriais de formas retas e cores desbotadas, muros pichados e sujeira preta por toda a parte. onde a neve já não é branca, porque a neve pisada diariamente por centenas de pessoas indo e voltando dos seus trabalhos e dos seus não trabalhos em friedrichshein não é a neve branca dos parques onde as crianças de prenzlauerberg andam de trenó. é o chão dos que sabem se camuflar e não querem ser vistos. é onde cada um se sente mais si e mais ninguém. olhei primeiro para o trem passando. a luz amarela e o calor de dentro dos vagões era uma provocação para mim e vc nem ligou. o trem é sempre o lugar para onde se pode ir para conseguir proteção ao preço de um bilhete validado caso apareça o controlador à paisana. um lugar quente à janela e uma mesinha onde se pode trabalhar enquanto a paisagem te atravessa sem te machucar. eu pensei nisso e me senti estranha por estar fora, sentindo o frio quase congelando meus pés. vc acho que não. claro que não. vc só se debruçou no parapeito pixado da ponte e ficou. eu olhando o trem e vc olhando o céu. eu penso mais em partir e vc pensa mais em ficar, ainda que seja pelo tempo de um instante. é uma dessas situações em que dá no mesmo e o que faz diferença é só a intenção. e por isso mesmo é uma dessas situações que não se consegue dizer. é impossível saber qual. por isso vc só produziu uma onomatopeia e declamou a citação do deleuze como se ele fosse um deus. depois traduziu do francês. alguma palavra que vc não encontrou em alemão não fez diferença porque eu já tinha entendido em francês. vc sempre esquece que eu entendo francês e que eu quase poderia falar se tomasse coragem. mas eu não me importo em ouvir a mesma coisa só que em línguas diferentes. eu até gosto. a imagem do buraco no céu tomou conta e a gente nem notou que estávamos misturando as línguas. a metáfora do declínio da sociedade industrial pelos ferros enferrujados já não interessava. embarcar num outro nível de vínculo com alguém é sempre algo que a gente não sabe de onde e nem como vem. só fomos inocentes em achar que era só nós dois. os raios do sol pelo buraco que se abriu na cobertura cinza e maciça que era um teto já não tinha nada a ver com o sopro da bomba que abriu brechas na parede de tijolos vermelhos durante a guerra. era justamente o oposto.

eu precisei de vc para fazer furos no meu guarda-chuva. e não pensei que, agora furado, ele não me protege mais quando chove.


- is it all over now baby blue?


- talvez. mas isso não é triste.



quarta-feira, 16 de junho de 2010

o que sobrou da gente é que somos o silêncio um do outro. um silêncio tão profundo que é um abraço.

terça-feira, 11 de maio de 2010

Tem uma lenda indiana que diz que quando vc domina completamente uma postura de yoga, as dualidades cessam e você medita no infinito. Dominar uma postura de yoga não é algo simples. Envolve manter o alinhamento, a coluna alongada, os ombros longe das orelhas e os musculos contraidos na medida certa. Continuar respirando calma e profundamente e manter o rosto sereno. De preferencia com um leve sorriso. É atenção total no próprio corpo. Entender como ele se move durante a imobilidade. Do que ele precisa. Na maior parte das vezes, ele só precisa que a respiração seja controlada. Respiração ofegante só é boa se não for por ansiedade, medo ou esforço. Dominar a postura é estar inteiro nela. Todos os sentidos alerta pra captar o prazer que ela te dá. O prazer sutil de uma vértebra que ganha mais espaço. O prazer de não ter passado, nem planos. Não é à toa que todas as dualidades cessam. Elas não acontecem no presente.

Dá um trabalhão conseguir isso, mas vale a pena.

Essa frase nao é minha, é dele. Eu lembrei dela agora e achei que cabia para falar da postura de yoga. Mas foi dita em outro contexto.

Ele olhou pra mim e disse: dá um trabalhão construir um amor, mas vale a pena.

E eu fiquei com vontade de dizer: dá, e só vale a pena se for igual a meditar no infinito.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Ahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh!!!!!!!!!!!

When you're drowning, you don't say 'I would be incredibly pleased if someone would have the foresight to notice me drowning and come and help me,' you just scream.

[frase do lennon e foto do warhol]

domingo, 2 de maio de 2010

i'm yours


and it's ok not finding the words to say it.

sábado, 1 de maio de 2010

make a plan to love me.


I won't do it, never mind.
(...)
You sound disappointed.
I'm not. It's okay. I'm going to listen to records and stuff.
Oh. That sounds fun.
Are you being sarcastic?
No, it does.
I'm really thirsty.

I stood in the doorway and tried to maintain my end of our silence while watching him scratch at calcified noodles. I was actually just standing there in love. I was not even really standing; if he had walked away suddenly, I would have fallen.

sexta-feira, 30 de abril de 2010

[foto gonzalo juanes]

terça-feira, 27 de abril de 2010

meet you at the statue in an hour.

e talvez não seja por acaso que eu me lembre de vc toda vez que ouço piazza, new york catcher do belle&sebatian.

nem que haja tanta gente fazendo covers dela (where do they all belong?).

segunda-feira, 26 de abril de 2010

À sombra das meninas em flor.

Eu acho que foi nesse livro que o proust escreveu uma frase que de tanto pensar nela eu acabei memorizando. Era mais ou menos assim: todo ser é destruído quando deixamos de vê-lo e sua próxima aparição é uma nova criação, distinta da que foi imediatamente anterior e talvez de todas.

Eu pensei novamente nela hoje. Talvez pela proximidade dos seres que eu destruí.

Quando a li pela primeira vez, achei que tinha entendido. Mas hoje ela própria me pareceu diferente e soou meio indecifrável. O vazio do sentido perdido foi uma dor e isso não deveria me abalar.

Mas se o seu mistério habitar algum lugar que fica entre o hábito e a memória, talvez ele seja meu vizinho.

domingo, 25 de abril de 2010

essa música é foda e não adianta dizer mais nada porque toda a minha capacidade de expressão não lhe faria justiça.


Every step of the way, we walk the line
Your days are numbered, so are mine
Time is piling up, we struggle and we stray
We're all boxed in, nowhere to escape
City's just a jungle, more games to play
Trapped in the heart of it, tryin' to get away
I was raised in the country, I been working in the town
I been in trouble ever since I set my suitcase down
Got nothing for you, I had nothing before
Don't even have anything for myself anymore
Sky full of fire, came pouring down
Nothing you can sell me, I'll see you around
All my powers of expression and thoughts so sublime
Could never do you justice in reason or rhyme
Only one thing I did wrong
Stayed in Mississippi a day too long
Well, the devil's in the alley, mule's in the stall
Say anything you wanna, I have heard it all
I was thinking about the things that Rosie said
I was dreaming I was sleeping in Rosie's bed
Walking through the leaves, falling from the trees
Feeling like a stranger nobody sees
So many things that we never will undo
I know you're sorry, I'm sorry too
Some people will offer you their hand and some won't
Last night I knew you, tonight I don't
I need something strong to distract my mind
I'm gonna look at you 'til my eyes go blind
Well I got here following the southern star
I crossed that river just to be where you are
Only one thing I did wrong
Stayed in Mississippi a day too long
Well my ship's been split to splinters and it's sinking fast
I'm drowning in the poison, got no future, got no past
But my heart is not weary, it's light and it's free
I've got nothing but affection for all those who sailed with me
Everybody's moving, if they ain't already there
Everybody's got to move somewhere
Stick with me baby, stick with me anyhow
Things should start to get interesting right about now
My clothes are wet, tight on my skin
Not as tight as the corner that I painted myself in
I know that fortune is waiting to be kind
So give me your hand and say you'll be mine
Well, the emptiness is endless, cold as the clay
You can always come back, but you can't come back all the way
Only one thing I did wrong:
Stayed in Mississippi a day too long.

[ismael, esse post é pra vc, claro!]

sábado, 24 de abril de 2010

Terça-feira, 20 de Abril de 2010 7:48:51 Cut up auf Leben und Körper


Era só mais um dia que começava com a caixa de emails cheia. Eu sempre começo apagando os spams e abrindo os chatos. Mas qdo eu vi o seu, fui direto nele, porque já fazia meses. Ele só tinha 4 frases soltas em letras pequenas:

I wish I could talk to you.
If I would have asked you, would you have been my girlfriend?
I miss you.
There no sun still here.

Eu li mais de uma vez para prestar atenção nos verbos. E depois tentar decifrar se havia alguma relação entre essas 3 afirmações, essa pergunta e o fato de elas terem aparecido na minha caixa de correio às 7:48 da manhã de uma terça-feira. Uma delas me pareceu a mãe da outra. O desejo sempre possível e quase nunca realizado é a origem da pergunta feita muito tempo depois no pretérito do subjuntivo. Eu pensei em te responder sure, we can talk at anytime. Nós podemos e sempre pudemos. But we never did. We never do. Tem um monte de outras coisas que a gente não consegue fazer neste momento por causa da distância, mas falar não é uma delas, pois temos paliativos. Talvez vc queira dizer mais que falar quando diz falar. A frase seguinte é mais uma dessas coisas que vc gosta de construir e que têm o efeito de te afastar do presente. Vc não viveu o presente dessa frase quando ele poderia ter sido presente. E isso significa que vc não deve vivê-la no preterito do subjuntivo. A combinação desse modo e desse tempo verbais é bem perigosa e foi ela que não te deixou perguntar como eu estou me sentindo hoje. Se você só se interessa em como eu teria me sentido, eu tenho que dar um jeito de te dizer que eu não me interesso por arrependimentos. E não é só uma questão de gosto. Como teria sido se a tal pergunta tivesse sido formulada no presente há meses atrás é simplesmente algo impossível de te responder. O dado real é apenas a pergunta não feita. A pergunta não feita e o tempo perdido são uma dimensão incontornável da nossa temporalidade. Um dado histórico que por isso mesmo é também o nosso presente. Mas a resposta a uma pergunta não feita simplesmente não pode ser imaginada. Essa resposta simplesmente não pode existir. E é só por isso que eu não consegui responder ao seu email até agora.

Aqui no hemisfério sul o sol está ficando cada vez mais fraco. Mas não é por causa da escuridão que eu não consigo olhar para um passado que nunca foi presente. I wish I could talk to you either.

sexta-feira, 23 de abril de 2010

comes a time

de você eu sinto saudades dos seus avós e de alguém pra conversar sobre filosofia da linguagem. essa frase pode parecer cruel, mas não é. eu acho bonita.


terça-feira, 20 de abril de 2010

Será que dor é o nome verdadeiro disso que a gente chama de dor?

- você é engraçada; sempre precipita os fins.
- é. eu tenho sim esse impulso de destruir as coisas antes da hora.
- por que?
- acho que é porque eu tenho medo de dor. isso sempre explica muita coisa sobre mim.
- tá, mas prá que antecipar?
- sei lá.
- posso te fazer uma pergunta meio exagerada?
- pode.
- vc já sabe que vai morrer. vc quer antecipar ou quer viver?
- viver.

segunda-feira, 19 de abril de 2010

something.

Curtir fossa numa noite de sábado é um clichê. Porque sábado à noite é o dia oficial de todos os clichês. Prefiro evitar, mas até entendo quem curte. Por isso prá saber o quanto a sua vida ficou careta, melhor não olhar para o sábado à noite e sim pras noites de segunda-feira. Marcamos uma despedida para hoje. Ontem eu tentei comprar legumes orgânicos para a nossa última janta juntos, mas não rolou. Acordei tarde demais e quando cheguei lá já estavam recolhendo a feira. É uma cena desoladora a de uma feira sendo desmontada. Um dos caras deve ter sacado a minha decepção e veio falar comigo. Sim, era mesmo tarde demais, mas ele me deu de presente quatro milhos, duas cenouras, um maço de alface e um de nabo. O que já é uma salada. E pelo menos valeu pelo rolê no parque. O dia tava lindo e os velhinhos seresteiros não estavam tocando nem sertanejo, nem Roberto. Estavam bombando no Jorge Ben e eu achei isso bem legal. Nem é do tempo deles. Também não é do meu e eu curto. Curto ouvir por aí, porque afinal esse é justamente o disco que eu não tenho mais. O homem da gravata florida foi embora. Eu poderia ter ficado ali o dia todo, mas acabei indo pro bexiga, com medo de perder os vinis. Tava com o dinheiro contado, porque esqueci de passar no caixa eletrônico, mas deu pra levar 4 do Paul & Linda e um do Cat Stevens que eu ainda não conhecia. Não tinha Zappa. Por isso eu resolvi explorar melhor o Paul e a Linda. É uma vibe mais inocente e mais alegre. Sinal de que nem todo domingo precisa acabar com John & Yoko para ser bom.

Eu não saí com você, mas fui beber numa rua com o seu nome. Foi coincidência, mas quando nos ligamos disso, achamos que esse seria um verso lindo para uma música. E essa seria uma música meio Lupicínio.

Hoje eu consegui acordar cedo e ir para a aula de yoga. Eu tava morrendo de sono e adormeci no relaxamento final. Acordei porque alguém esqueceu o celular ligado e ele tocou no meio do silêncio das respirações descoordenadas. O ringtone era all the lonely people e não something.

A moral da história é que nem sempre podemos escolher a trilha-sonora dos nossos dias.

sábado, 17 de abril de 2010

porque é muita liberdade poder dizer: tell me why. e muitas vezes é só o que resta.




After the gold rush é um dos melhores álbuns do século. E se vc nao é daqueles que se abala por falsas questões, vai encontrar nele uma musica para cada um dos temas pelos quais vale a pena sofrer. After the gold rush é para ouvir com atenção, sentar tranquilo e se concentrar só nele. Um lado após o outro, prestando atenção nas letras. Foi essa a advertencia que o dono da banca me deu quando me vendeu esse vinil. Na hora soou qse uma ameaça e se eu nao parecesse levar a serio o conselho, talvez ele nao me vendesse. E eu pensei que isso era coisa de velho louco colecionador. Não era. Qualquer um que conhece, desenvolve amor por esse vinil. Um amor que vc guarda para poucas coisas. As que entram na lista das melhores do mundo. E eu sempre sigo o conselho daquele velho magro, que tá sempre usando alguma camisa preta de banda de rock progressivo. Mas ontem nós dois precisávamos de uma cerveja. Havia urgência, por isso terminamos de ouvir tell me why, pedimos desculpas para o tio young e paramos a vitrola no começo da segunda música do lado A, que a essa altura ja tava tocando pela segunda vez da noite. Levamos menos de cinco minutos para chegar no nosso bar preferido. Um dos ultimos bares decentes do meu bairro. E ele fica virando a esquina de casa, a mesma distância da padaria. Nesse caminho era como se ainda tocasse a musica. Eu assoviava. Parava. Você cantaralova.
– Eu acho que essa frase é universal.
– Pode crer. Vc pode falar isso pra qualquer um.
– E em qualquer situação.
– Vc pode falar isso pra um psicopata serial killer e pro garoto que te deu um bolo numa noite de sábado.
– Vc acha que a gente tem uma tendência natural a buscar explicações?
– Acho que mais ou menos.
– Será que é porque a gente tem medo do irracional?
– Não, acho que é porque temos medo da solidão. POrque se fosse só eu comigo mesmo, era mais fácil. Não precisava explicar nada, nem pedir explicações.
– Pode ser, não tinha pensado desse jeito. Prá mim era mais um lance de - pô, fala sério. Porque quando vc olha prá alguém e pergunta por que, leva o outro a se ligar. A pelo menos assumir posição.
– Se vc vivesse sozinho no mundo, as razões não teriam importância. Se fosse assim a coisa tava fácil. O lance é que a gente tem que convencer o outro.
– Faz sentido, porque no fundo vc não quer ficar pirando e curtindo o lance sozinho.
– Obvio.O legal é convencer os outros a entrarem na sua viagem. Nas coisas que te fazem pirar.
– Na real, se vc convencer só uma pessoa já basta.
– É. Daí vc entende um pouco mais o q é o amor. Tá bem próximo de uma urgência em se comunicar.
– É isso aí mesmo.
– O meu analista diz que relacionamento é só poder dar um tempo de si mesmo. Poder se perder um pouquinho do próprio ego. Por isso é que é bom.
– É. Também acho. Deve ser por isso que quando eu não me suporto, eu tô mais promiscuo.
– Prá se perder bastante. E em muitos...
- (...)
- Sabe que eu tô achando bom voltar a mim mesma um pouco nesta noite...
- É foda essa sensação. Saudades de si.
- Essa é a hora que vc tem q seguir o conselho do tio do vinil.
- Eu cansei de porto alegre porque já não encontro descanso de mim lá.
– A gente tá sempre oscilando entre os dois extremos. E ao mesmo tempo tentando ficar em pé.
- Eu só queria ter que não carregar sozinho os meus instrumentos.
- Se vc ler a letra de tell me why, vai ver que é perfeita pro que a gente tá vivendo, só que com uma diferença de grau.
– Pode crer.
– Chega uma hora que tell me why é a penultima coisa que se tem a dizer. Porque a última mesmo é poder falar: you could write a book on how to ruin someone's perfect day.
– Essa frase é do caralho.
– A gente podia fazer uma camiseta escrita: tell me why.
– Vamos. POrque essa é mesmo foda. É um statement. E nem precisa botar o ponto de interrogação.
– Não precisa.
– Tell me why, é tell me why, cara.
– É, não é uma pergunta. É um imperativo.

terça-feira, 13 de abril de 2010

ho-ba-la-lá uma canção

- Eu sou tímida.

- Não parece.

- Só a minha fisioterapeuta entendeu isso. Olhando para o movimento inercial dos meus ombros.

- Eu jamais diria.

- Timidez não tem nada a ver com o quanto se fala. É só uma certa tendência à incomunicabilidade.

- Isso parece uma ameaça.

- Não. Mas pode ser um aviso, tipo manual de utilização.

- Eu gosto do seu sorriso.

- Eu gosto de quando vc aperta os olhos para enxergar melhor o que está perto.

- Talvez eu tenha que trocar de óculos.

- Como se roubar o meu diário adiantasse.

- Eu não li o que veio antes de mim.

- Eu não dou a mínima. E não reconheço proibições. Essas duas frases são de um amigo meu, mas leia como se fossem minhas.

- O que vc é dele?

- Ele pressente quando eu estou para chegar.

- (...)

- O meu professor de yoga me contou que quem tem pino em alguma parte do corpo sente quando vai chover.

- (....)

- Alguma coisa a ver com a sensibilidade à mudança de pressão atmosférica.

- (...)

- Vc sabe mais de mim do que eu de vc... Mas na real eu não ligo.

- (...)

- E os seus silencios não me incomodam.

- O que vc quer saber?

- Nada. Só o que vc quiser contar. E qual a sua música preferida do Bob Dylan.

- A sua é it aint me babe, não é?

- Vc se lembra?

- Sim. (Vc me disse isso no dia em que usava brincos cor-de-laranja, iguais nas duas orelhas).

- É. Mas depende da época. E nem sempre a mais importante é a que está no primeiro lugar. (E eu normalmente uso um brinco diferente em cada orelha porque não gosto da sensação de simetria).

- (...)

- (Simetria não tem nada a ver com reciprocidade).

- Todas as canções têm prá contar.

- O que não sei dizer é mais importante do que o que eu digo.

segunda-feira, 5 de abril de 2010

terça-feira, 30 de março de 2010

terça-feira em são paulo:

suddenly your loneliness makes sense among others' and some life, yet unspent, might explode.

domingo, 28 de março de 2010

around?

às vezes eu mexo em caixas que é como se estivessem fechadas para sempre. porque temos muitos jeitos de dizer nunca. guardo coisas que eu não tive coragem de destruir, o que as condenou a uma sobrevivência medíocre. não é sempre que eu as olho, pois é impossível viver o presente com tanto passado. só se faz isso em dia de mudança ou de estante nova. nos demais,´è preciso deixar o esquecimento exalar seu perfume antisséptico. eu abro uma caixa e olho para coisas que eu nao sinto falta. do you miss me like you said you do? essa música se chama miss misery e é da trilha de um dos meus filmes preferidos. toca no final, quando ele resolve pegar o carro e ir para a califórnia encontrar ela. eu acho que hoje eu estou muito mais perto de lá. ainda que o perto demore um pouco, isso já é alguma coisa. pelo menos eu já posso fazer planos e preparar a playlist que vai tocar na viagem entre los angeles e são francisco.

ontem foi casamento de uma amiga da faculdade e eu não fui. casamentos são estranhos e a música que toca é sempre ruim. mas as pessoas dançam ou porque são falsas demais ou inocentes demais. eu já fui as duas coisas e não quero mais. elliot smith continua tocando e ele sempre diz algo certeiro para mim. é ele que descreve como eu me sinto uma bosta na manhã seguinte. na manhã seguinte, eu sou mais elliot smith do que bukowski. provavelmente porque na noite anterior também tenha sido assim. mas sei que eu posso ser o outro, se eu quiser. sei onde está a saída e como chegar lá e isso basta, ainda que eu decida ficar. não é por acaso que agora está tocando between the bars.

searching west and east and all points in-between, underneath the lines of thought: you're there and then you're not

sábado, 27 de março de 2010

insolação.

- Eu estou esperando alguém.

- Essa é uma frase muito bonita.

- Voce quer tomar um café?

Assim termina o filme. Vc viu o filme antes de termos nós mesmos pronunciado essas frases na semana passada. E pode ser que só esse fato já faça diferença na opinião que temos sobre o final do filme. Com tantas coisas inexplicadas, e que por isso parecem tão reais. São a mesmas frases, só que em ordem diferente. Faz toda a diferença não acabar na frase do café. É, a da espera é uma frase bonita mesmo. A espera é bonita não tanto porque as possibilidades de quem espera sejam infinitas, mas porque achamos que são. E alguém fala uma frase parecida com essa logo no começo do filme, mas sobre a juventude. Que não deixa de ser um tipo de espera também. Eu diria que é um tipo de beleza em abstrato. Porque quase sempre o que é bonito de contar é ruim de viver. Eu queria que a espera fosse mais curta do que o tempo que eu levo para pronunciar por inteiro a frase: - Eu te espero. Assim, quando eu terminasse de falar o o, a frase já seria obsoleta. Mas ainda seria bonita.

- Logo. [Você me diz.]

- Quão logo é logo? [ Eu pergunto e penso que essa frase parece de uma música do Belle & Sebastian.]

- A sua testa está quente. Parece que você pegou uma insolação. [Essa frase também veio do filme. E o calor é o que estou sentindo agora.]

quinta-feira, 25 de março de 2010

the horses are here

eu vinha andando rápido pelo lado direito, desviando em zigue-zague das pessoas que caminhavam na direção oposta, quando soou o aviso seco e as portas se fecharam. o trem que me levaria a baden-baden começou a se movimentar e eu perdi a conexão. esse é o momento em que vc se sente como se estivesse de pé no centro da quadra do jogo de vôlei do colégio vendo a bola passar bem acima da sua cabeça. não há o que fazer. ela não esta mais ao seu alcance, mas isso nem é ruim. vc só tem que se posicionar novamente e esperar pelo próximo saque. eu acompanhei tudo só com o movimento do pescoco e qdo minha cabeça terminou de fazer o arco e voltou a estar no mesmo eixo que a coluna, eu pensei numa coisa que eu havia lido em algum lugar e até hj não me lembro onde. algo que dizia sobre a transformação do tempo que acontece nesse exato minuto em que a porta do vagão se fecha e o trem começa a andar te deixando do lado de fora. de repente o tempo, que era escasso, fica abundante. vc tem tempo de sobra prá matar até que o proximo trem passe. aquilo que era só pressa e ânsia vira uma espécie de espera calma e entediante. sentada no banco da estação, vc já nem olha mais o relógio e só precisa pensar em fazer algo para se entreter. mirar o olhar longe até os seus olhos alcançarem o horizonte lá no fundo, depois das árvores, e procurar um pensamento agradável para seguir. o próximo trem chegará na plataforma 6 às 17:37 e se vc vai ou não conseguir pegá-lo não está mais em questão. é um sentimento meio contraditório, porque no instante em que o tempo em vez de fugir resolve ficar, vc imediatamente se sente de mãos vazias. vc olha pros lados e nem sabe direito o que fazer com elas. aquilo q vc tentava esmagar com a força dos dedos desaparece rápido. vc já não precisa ficar oscilando ofegantemente entre o pessimismo incrédulo e o otimismo místico. tudo isso acaba de escorrer pelos vãos dos seus dedos e cair no chão sujo da estação. eu deixei cair a última mordida do sanduiche que estava comendo. aquele pedaço de pão já estava quase apodrecendo, mas eu queria continuar não sei bem porquê. eu me sinto aliviada, mas ao mesmo tempo um pouco perdida. olho de um jeito meio nostálgico para aquilo que já estava me dando náuseas, mas por alguma razão queria continuar mastigando. eu sei que não posso pegar de volta do chão. eu nem quero, mas penso nessa possibilidade. no final das contas, sinto uma espécie de resignaçao boa. devagar eu me sento no banco da estação e é como se ao mesmo tempo nada estivesse faltando e tudo estivesse faltando. é uma espécie de vazio satisfeito. sinto que o banco é confortável, mas sei que em algum momento ele vai começar a me incomodar. por enquanto isso não me preocupa. eu deixo a mochila do meu lado direito e vou girando o botão redondo do ipod para baixo até parar em uma das minhas musicas preferidas. escolho um canto bonito do céu para estar olhando bem no momento em que ela começar a tocar. eu sei que em breve estarei atravessando o país em direção ao sul, onde a primavera já chegou. mas por enquanto estou sentindo o chão frio e firme bem embaixo dos meus pés. não há angustia. está tudo certo, mas esperar por vc é como estar sentada no banco da plataforma 6.

segunda-feira, 22 de março de 2010

meditação

Eu estava descendo a Pamplona e do lado direito vi um restaurante com uma faixa branca cheia de informações sobre menus promocionais e no final um aviso de que eles tambem têm sistema buffet. O cartaz dizia: "coma à vontatade". Isso mesmo, com dois tas. Eu fiquei pensando no cara que errou. Deve ter ficado puto, porque errou bem no final. Deve ter ligado pro cliente, contado a real e oferecido a placa errada sem cobrar nada. Pelo menos ele não gastaria mais material, nem trabalho. O dono do restaurante, por sua vez, conseguiu uma placa de graça. Tem um erro no final, mas nao importa porque todo mundo entendeu o recado. Eu fiquei pensando sobre isso uns quarto quarteirões pra baixo e de repente me surpreendi com o tamanho do pensamento que eu fui capaz de engrenar, sem perceber, sobre uma sílaba a mais na placa de um restaurante que tem sistema a kilo ou buffet. Desde que eu comecei a tentar meditar eu percebo que nao tenho nenhum controle sobre os pensamentos que aparecem ou somem da minha cabeça. O segredo da meditação é nao se prender a nenhum deles. Deixar eles irem embora, de modo tão inesperado e silencioso quanto chegaram. Eu só não posso me assustar com a minha capacidade imensa de pensar em coisas inúteis. É impossível evitar. Que nem quando eu começo a pensar em vc durante o dia. É quase tão inútil quanto pensar na placa. Vc é só um pensamento que aparece de vez em quando e eu tenho que deixar ir embora. Por mais que isso pareça estranho, certas coisas se resolvem durante o silêncio:

domingo, 21 de março de 2010

rubber soul



eu olho para o porta-retrato que fica na estante em cima do som e vejo a foto antiga da minha mãe. eu gosto dessa foto. não só porque é a foto da minha mãe, mas porque ela tem uma composição que faz muito sentido prá mim esteticamente. ou porque eu devo ter achado legal ver as duas coisas juntas. por isso resgatei ela do meio da bagunça da mudança e a botei no porta-retrato vazio. eu acho que a garota da foto já era minha mãe e isso quer dizer que essa foto já é bem antiga. as cores têm uma harmonia lavada. o verde envelhecido da grama combina com o maiô vinho-quase-marrom que ela está usando. ela está sentada na grama e tem uma árvore cortada atrás dela. o toco da árvore em tese não combinaria com a felicidade dela. nem com o sorriso doce, nem com o boné branco que ela está usando, que dá um tom meio inocente para a cena. acho que hoje em dia ninguém ia querer tirar uma foto ao lado de uma árvore cortada. mas eles viram a beleza desse objeto quase morto. ou nem se preocuparam com a paisagem atrás. é bem possível que quem tenha tirado a foto - talvez meu pai, talvez meu tio - estivesse tão consumido pela beleza da garota, que não prestou mais atenção em nada. eles provavelmente estão no que meus pais chamam de "o clube fiscal". eu não me lembro de ter estado, mas eles dizem que a gente sempre passava os fins de semana lá com os meus tios quando eu era criança. e que minha tia cozinhava empanadas para levar. eu sempre achei o nome desse clube meio estranho, mas depois de grande eu me liguei que "o clube fiscal" devia ser o jeito abreviado de dizer que o clube era de alguma associação de fiscais. tipo fiscais do imposto de renda. meus pais não são fiscais. qualquer dia vou perguntar a eles porque conseguiam frequentar o clube. é provável que eles tivessem algum amigo fiscal. se eu me lembrasse, eu teria nostalgia desse tempo em que passávamos os domingos fazendo pic-nic no clube fiscal. um grupo de amigos saindo de são paulo em caravana, levando comida caseira e filhos para passar um dia no sol. era o tempo dos corcéis. eu sei que meu pai teve um corcel I vermelho e depois um corcel II verde claro. eu só me lembro do segundo e na minha cabeça ele tinha umas marcas de ferrugem perto do porta-malas, o que quer dizer que minha memória só chega a alcançar o tempo em que o carro já estava velho. a ford produziu corcéis no brasil entre 68 e 86. eu nasci numa época em que ainda se produziam corcéis no brasil e isso já é o suficiente para definir uma geração. quando eu olho bem para o rosto da minha mãe nessa foto, eu sempre acho ela meio parecida com o john lennon na capa do rubber soul. a diferença é que ela está sorrindo e ele não. a árvore atrás dele tem galhos e folhas e a que está atrás dela não. ela está sozinha no meio da foto e ele também.

sábado, 13 de março de 2010

Ce matin là

o dia amanheceu e a luz entrando no quarto pelos furos da persiana fez com que notássemos que aquela era a primeira da manhã. naquele amanhecer, o dia era a promessa de algo que em breve se desfez. quando vc foi embora, eu não tive sono. eu botei uma música calma e parei na varanda para sentir sentimentos tautológicos me atravessando. aqueles que chegam no limite da linguagem, porque são inabarcáveis. "estou fascinada" é uma frase que não pode receber qualquer complemento. por isso, eu vou ficar esperando pela segunda da manhã. ainda que não seja manhã. e ainda que percamos a conta.

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

aviso de ausência temporária.

eu me mudei temporariamente para berlin, kollwitzstrasse 52. visite-me:
http://kollwitzstrasse.blogspot.com/