quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

brand new start

Quando eu cheguei no meu quarto nenhuma nova idéia me ocorreu. Eu deixei a mochila no chão e fiquei de casaco, touca e luvas ainda por um tempo tentando que meus pés e mãos descongelassem. Mas olhando de fora, é como se eu não quisesse pertencer ao lugar onde estava. Que esse é um dos invernos mais duros dos últimos tempos na Europa eu venho sentindo na própria pele. Mas também leio isso quase sempre nos jornais. Mais uma prova de que os jornais não servem mais. Eles noticiam sempre o que já sabemos e não se deram conta ainda de que deveriam fazer outra coisa agora. Eu olhei em volta e senti uma certa decepção pela falta de novidade. Ninguém passou por aqui desde que eu saí. Provavelmente nem sequer um inseto. Nenhuma correspondência chegou, nem sequer propaganda de alguma loja avisando que entrou em promoção. É engraçado como buscamos o tempo todo sinais da ação de outros seres vivos. Sinais que camuflem a solidão. Diálogos silenciosos. Agora eu entendo porque o dia da faxineira é tão importante para pessoas que vivem sozinhas. Porque minha avó falava a semana toda da faxineira e das coisas que ela havia mudado de lugar e feito errado. A faxineira faz uma pequena revolução semanal. Alguém que chega para mostrar que os objetos estão vivos. Eu olhei em volta e vi a roupa que deixei no chão quando voltei bêbada da última festa que fui aqui. Pelo menos não cheirava mais a cigarro. Antes que eu sentisse pena de mim mesma olhando para o tamanho do quarto onde teria que viver por mais um mês, uma velha idéia me ocorreu. A de que eu poderia fazer uma faxina nele. Foi o que eu fiz. O nosso velho método. Fui até o depósito, peguei produtos e instrumentos de limpeza e me dediquei à faxina como se fosse a coisa mais importante que poderia fazer neste dia. Depois mudei os móveis de lugar. Coloquei as coisas da mala no armário. Dobrei de novo todas as malhas e coloquei-as na estante empilhadas. Prestei atenção na seqüência de cores. Pendurei as calças em cabides. Organizei os livros. O banheiro ficou cheirando a limão. Lavei as calcinhas e pendurei-as ao lado do aquecedor. Por fim, tomei um banho demorado e quente e usei todos os cosméticos que tenho. Dois tipos diferentes de sabão para o rosto. Shampoo e condicionador sem químicos, que comprei em uma loja de produtos naturais. E cremes hidratantes especiais para diferentes partes do corpo. Já conversamos sobre isso, a higiene para tentar reconstruir os fragmentos de nós mesmos. Ou como técnica para sublimação. Ou redenção. Ou purificação. Não importa, há vários tipos de indicações, dependendo do momento. E quase sempre funciona. Neste caso, eu estava tentando só começar de novo de onde eu tinha parado. Depois eu me lembrei que eu estava justamente tentando me livrar desse hábito. Do hábito de tentar resolver tudo com higiene, porque isso estava me parecendo um método meio fascista. Porque no final eu acho que eu sempre acabo me jogando ralo abaixo. Um pouco de mim sempre vai embora junto com o meu cheiro. E não são apenas as células mortas. Eu estava tomando menos banhos e lavando menos as minhas roupas nos últimos tempos. E estava tudo indo bem até hoje. Eu estava conseguindo me manter equilibrada junto com a minha sujeira. E não tinha tido problemas de mau-cheiro ou mau-hálito, como muitas pessoas daqui têm. Eu sentei de novo na beirada da cama com a sensação de que havia gasto a minha última bala e nada acontecera. Pelo menos o meu quarto ficara mais habitável. Eu ainda não havia escovado os dentes. Então fiz isso. Com tanta força que talvez tenha machucado as minhas gengivas. Ainda era dia, mas eu não queria voltar a trabalhar hoje. Eu pensei em organizar os arquivos do meu computador, mas achei mais fácil abrir uma pasta nova para 2009 e esquecer tudo o que veio antes. Seria um pouco como começar de novo. Talvez eu estivesse com fome, sem perceber. Eu sempre demoro a perceber a fome até que de repente começo a tremer. E eu sempre acho que isso é falta de café. Eu fiz café para mim e me sentei na janela, para olhar a rua. Quando ele acabou, eu pensei que queria poder falar com alguém. E queria que alguém quisesse falar comigo. Então recomecei a ler o seu livro.

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