domingo, 21 de dezembro de 2008

Dance, dance, dance!

Eu nunca tinha conhecido alguém da Sri Lanka. Anura e seu filho que é filho de um amigo dele foram os primeiros. Se a Sri Lanka é um lugar perdido no mapa mundi da sua parede, eu talvez tenha estado lá ontem. Fica na Stühlingenstrasse, número 9. Mas eu nem precisei verificar o número para achar. Naquele bairro escuro e silencioso, eu fui capaz de chegar no lugar certo apenas seguindo o calor do som. Na porta de vidro, o letreiro do restaurante de Anura dizia “salat und party express”. Eu nunca fui lá na hora do almoço, mas é bem capaz que a referencia à festa-express também se aplique à vida diurna daquele lugar. Eu não sei se na Sri Lanka as pessoas são místicas, mas eu já não duvido da capacidade de Anura de fazer milagres. De prolongar o entusiasmo da sexta-feira à noite para os almoços com tempo controlado dos dias de semana. Eu não me surpreenderia se me dissessem que ele pode parar o tempo entre meio-dia e meio e duas nos dias da semana para que os estudantes possam respirar um pouquinho do ar do seu pais antes de voltar para a universidade. Eu não duvidaria de nada depois do que foi sexta-feira neste lugar perdido no tempo e no espaço. Nesta noite, este era um restaurante sem mesas. E ninguém pagava pela bebida ou pela comida, de sabor incrivelmente exótico. Uma noite excepcional que se repete a cada quinze dias.O dia em que Anura cozinha para todos e chama os amigos para tocar música. O dia em que aquele pequeno restaurante que é também a sua casa se transforma no ponto cego do mapa do mundo. Um lugar em que não há distâncias entre lugares ou entre pessoas. Não há desconhecidos. Não há gravidade. E assim fica muito mais fácil dançar. Naquele lugar quente e de luzes coloridas, a jam começava com o africanos tocando um som que eu nunca havia sentido antes, numa língua que eu nunca havia ouvido antes, enquanto o chão impulsionava as minhas pernas. E os meus braços subiam harmonicamente para fazer movimentos engraçados no ar. Depois veio o som estranho que acompanhava o menino belga que tinha a voz do eddie vedder e a essa altura eu já estava dançando numa espécie de transe e pensando que dançar é o estado natural do meu corpo. Talvez dançar seja ao mesmo tempo o ato mais íntimo e mais social que possa existir. Porque se trata de encontrar a si mesmo em seu próprio ritmo. Encontrar a própria singularidade a partir dos sentimentos provocados pelas ondas do som e da luz e pelos movimentos daqueles que nos cercam. E quando conseguimos nos encontrar, isso significa que já estamos prontos para virar junto com esses outros uma massa vibrante de seres humanos que se comunicam de outra forma. Habermas não pode explicar tudo, porque não entendeu que dançar é comunicação social em sua forma mais livre. Liberta até mesmo das amarras da língua. E em seu estado mais intenso e verdadeiro. Porque quando nos mexemos quebramos as camadas de gesso que nos cobre e fazemos aparecer aos poucos a nossa verdadeira matéria. Carne e sensações, movimento e energia, vibração e pulsão. Algo acontece quando dançamos. Dentro e fora de nós. Não importa se estamos na sua sala ou na Sri Lanka. Descobrimo-nos seres que têm vontade de viver e recusam-se a ficar parados. Seres ao mesmo tempo tão iguais e tão diferentes fazendo o que podem com tudo o que lhes resta. Com o que mais importa.

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